quinta-feira, 4 de junho de 2015

Caixa Sensória - O Objeto Polissêmico, o relato.

“O domínio de uma nova linguagem oferece, à pessoa que a domina, uma nova forma de conhecer a realidade, e de transmitir aos demais, esse conhecimento. Cada linguagem é absolutamente insubstituível. Todas as linguagens se complementam no mais perfeito e amplo conhecimento do real. Isto é, a realidade é mais perfeita e amplamente conhecida através da soma de todas as linguagens capazes de expressá-la.” (BOAL, Augusto. Teatro do Oprimido e outras poéticas políticas. 2011. p 180)

Uma caixa linda, transparente que em sua própria textura e forma já mobilizava os sentidos. Um caminho, muitos encontros, muitos amigos. Éramos quatro artistas e suas intervenções. Quatro formas de se pensar e sentir os sentidos. Jamile de criança era quem recebia os primeiros andarilhos. Vendava-lhes os olhos e o jogo sensório dava início. Texturas, aromas eram experimentados. Em seguida, Silas e as cicatrizes. Memória Emotiva que fazia vir à tona uma cor que era pingada numa bacia dourada. Ambos, artista e andarilho colocam as mãos lá dentro e olho no olho, as cicatrizes eram compartilhadas. No meio do caminho, ‘O Objeto Polissêmico’ proposto pela minha pesquisa sobre ‘As contribuições de Boal: jogos e estética’. O objetivo era mediar o contato do participante ou participantes com os objetos disponibilizados para que a obra de arte fosse criada a partir da relação de poder entre eles. Foi durante a intervenção que os caminhos nessa mediação foram se tornando mais claros. Por mais que eu já tivesse pensado previamente num texto para a explicação da atividade, foi no momento da criação que a fala foi se ajustando ao entendimento da comunicação. Todos os meus amigos artistas haviam criado um personagem para a sua intervenção (logo após a minha intervenção, tinha a de Jose com sua vovó, onde ela servia chá com jujuba dentro da xícara e biscoitos. As pessoas eram convidadas por ela mesma a se sentarem para tomar um chá e ouvir histórias) e eu havia decidido que por querer só mediar que não iria criar um personagem. Mas daí, que durante a instalação eu fui percebendo que como eu mediava deixando a pessoa livre para criar sua obra eu tinha mais tempo de perceber os outros artistas e comecei a perceber o andamento desta fila de pessoas dentro da caixa. Então, comecei a mediar o fluxo dos andarilhos, pois tínhamos um tempo previsto para começar as palestras sem atrasos exorbitantes. Foi então, que comecei a me perguntar se eu não havia criado o personagem-mediador ou pelo menos desempenhava seu papel de mediação. Foi importante perceber um rapaz quando o perguntei se ele gostaria de criar sua obra de arte. Ele me olhou como se por um momento pudesse duvidar daquela possibilidade e pude entender que era justamente essa distância entre arte e observador que Boal se propunha a diminuir ou, até mesmo, excluir. Poder entregar nas mãos das pessoas os meios de produção das mais variadas linguagens para que elas pudessem conhecer a sua realidade e se capacitarem de modo a transformá-la. Ao invés de apresentar uma obra de arte para o espectador, mobilizar o mesmo a criar a sua obra de arte e deixar de ser espectador/objeto/passivo para sujeito transformador. Acredito que assim como em mim, em todos os outros artistas que compunham a caixa sensória e Fabrícia, Marina e Célida que não estiveram diretamente na caixa, mas ajudaram a construí-la devam também ter sido provocadas pelas intervenções. Observando os registros em casa é que pude me encantar ao observar as criações feitas e compreender um pouco mais como alguns pensamentos são expressos e comunicados através de uma nova linguagem que não a idiomática. Conforme a tabela abaixo, acredito que a comunicação da realidade tenha se dado através da linguagem artística (escultura) oferecida ao andarilho e que a constatação desta realidade tenha se dado através dos objetos utilizados (sendo que esses objetos tinham valores simbólicos como religião, sexualidade, educação, tempo, capitalismo, gênero, etc)e das suas relações de poder. Tanto os objetos como as relações de poder foram pensados enquanto materialidades possíveis assim como próprio escultor que traz em si a tríade do ser sensível/consciente/cultural. A minha dúvida é se a transformação desta realidade tenha se dado através do ato da criação (a organização desses objetos utilizando-se das relações de poder entre eles e o espaço e entre eles mesmos) ou se eu precisaria ter orientado-os da seguinte forma: crie uma obra de arte a partir das relações de poder entre os objetos disponibilizados e escolhidos e, em seguida, propor que eles modificassem aquela estrutura para uma que possivelmente fosse uma solução ou evolução. Discutindo com um amigo artista e tendo como base o quadro abaixo, busco a definição de léxico e sintaxe. O primeiro refere-se a dicionário e o segundo ao componente do sistema linguístico que determina as relações formais que interligam os constituintes da sentença, atribuindo-lhe uma estrutura. Desta maneira, acredito que a transformação da realidade se daria na segunda escultura criada, pois a primeira seria só a expressão da realidade.


QUADRO DE DIVERSAS LINGUAGENS.


COMUNICAÇÃO DA REALIDADE
CONSTATAÇÃO DA REALIDADE
TRANSORMAÇÃO DA REALIDADE
Linguagem
Léxico (vocabulário)
Sintaxe
Idioma
Palavras
Oração (sujeito, objeto, predicado verbal, etc.)
Música
Instrumentos musicais e seus sons (timbre, tonalidade, etc.) e notas
Frase musical, melodia e ritmo
Pintura
Cores e formas
Cada estilo possui sua própria sintaxe
Cinema
Imagem (secundariamente, a música e a palavra)
Montagem: corte, fusão, superposição, fade-in, fade-out, travelling, etc.
Teatro
SOMA DE TODAS AS LINGUAGENS POSSÍVEIS: palavras, cores, formas, movimentos, sons, etc.
AÇÃO DRAMÁTICA



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