Relatório referente à ‘Oficina teatral para professores da rede
pública com jogos e exercícios do Teatro do Oprimido’, ministrada na cidade
de Tucano.
Inicialmente o projeto foi
criado para atender a um grupo de professores da rede pública, porém no dia da
oficina, os alunos foram chegando e à medida que eles iam se apresentando pude
perceber que havia professores e alunos também. As inscrições ficaram sob os
cuidados dos coordenadores da própria cidade. Devido também a essa
heterogeneidade de funções, as idades entre eles também fora diversificada e em
nada prejudicou o andamento do dia. Alguns jogos sofrerão pequenas modificações
conforme eu fui percebendo a turma assim como o próprio plano de aula. Como eu
não havia tido organização para xerocar os textos que iríamos ler em sala de
aula, esta etapa não fora cumprida. Esse ocorrido não afetou negativamente a
oficina que mesmo sem essa atividade acabou por terminar no horário previsto. A
materialidade usada foi a cadeira em alguns exercícios. Os momentos que mais me
chamaram a atenção foram:
1.
No jogo ‘as cadeiras no espaço vazio’, duas participantes me chamaram a
atenção. A primeira foi uma professora. A imagem que ela assistia era a de
quatro pessoas sentadas no chão, apoiando-se em suas cadeiras e ao redor de uma
quinta em pé em sua cadeira colocada no centro. Enquanto todos atribuíram o
maior poder a quinta pessoa em cima da cadeira no centro, essa docente/participante
perguntou-me se ela poderia ter outra opinião e eu, prontamente, disse que sim.
Gostaria de ver a sua diferença, pois até eu havia pensado como os demais. E
ela me surpreendeu quando atribui maior poder a uma aluna que estava sentada no
chão pela forma espontânea e tranquila que expressava. Achei bastante
significativa essa leitura, pois ela mostrara uma forma de pensar individual e
criativa.
“Como professor não devo
poupar oportunidade para testemunhar aos alunos a segurança com que me comporto
ao discutir um tema, ao analisar um fato, ao expor minha posição em face de uma
decisão governamental. Minha segurança não repousa na falsa suposição de que
sei tudo, de que sou o ‘maior’. Minha segurança se funda na convicção de que
sei algo e de que ignoro algo a que se junta a certeza de que posso saber
melhor o que já sei e conhecer o que ainda não sei. Minha segurança se alicerça
no saber confirmado pela própria experiência de que, se minha inconclusão, de
que sou consciente, atesta, de um lado, minha ignorância, me abre, de outro, o
caminho para conhecer.” (FREIRE, 1998. P. 153).
A
segunda foi uma participante que viu a seguinte imagem: quatro jogadores
sentados em suas cadeiras de frente para a plateia e uma quinta sentada de
costas para o público e de frente para os demais jogadores. Esta aluna atribuiu
o maior poder para esta jogadora de costas, pois ela entendeu que aquela cena
era a de uma sala de aula e que a aluna de costas representava a professora e
por isso o maior poder e os demais representavam os alunos. Esta me chamou a
atenção, pois percebi como muitas pessoas atribuem poder ao professor e
esquecem-se que a força encontra-se (a meu ver) na dialética entre docente e
discente. Ambos constroem a força neste processo horizontal de aprendizagem.
Ambos trocam sabedorias e conhecimentos. Este jogo, por exemplo, sofreu alterações
da minha parte.
2.
No jogo ‘as sete cadeiras’, uma participante me chamou a atenção. Conforme o
objetivo do jogo, ela tinha de criar duas imagens com o uso de uma cadeira,
onde a primeira imagem refletiria um maior poder e a segunda, um menor poder. Diferente
do jogo anterior, a imagem gerada aqui era individual e não mais coletiva. A
sua primeira imagem foi a dela sentada na cadeira estudando. Essa foi a imagem
de maior poder para ela. A sua segunda imagem, foi uma pessoa sentada no chão e
apoiada na cadeira com o cotovelo fumava um cigarro. Essa fora a de menor
poder. Ela me chamou a atenção, pois enquanto estudante de um grupo de teatro e
adolescente, ela se colocou como sujeito de sua história ao afirmar que seu
maior poder era a sua busca pelo conhecimento enquanto seu menor poder era o
vício. Interessante essa imagem de autonomia que ela criou. Muita gente tende a
colocar o poder na mão do professor e achar que o discente é um mero depósito.
“A Estética do Oprimido é uma forma
essencial de combater a Invasão dos Cérebros porque coloca o oprimido como
protagonista do processo estético, não simples fruidor de arte.” (BOAL. 2009. p.
166).
3. Na
Técnica do Teatro Imagem, no jogo ‘imagem
de transição’, as três cenas criadas para a imagem ideal me deixaram
bastante satisfeito, pois nenhuma continha opressão. Geralmente, ao querer nos
desoprimir, assumimos o lugar de opressor. No final de cada imagem ideal, eu
perguntava se alguém da plateia gostaria de mudar alguma coisa. Ninguém quis.
Na última cena, as imagens eram: a real,
uma professora escrevendo no quadro e duas alunas sentadas no whatzapp e a ideal, a professora sentada de frente
para as duas alunas. Pensando nas observações a cerca desta distância entre
professor/aluno, deste poder concentrado mais no primeiro, eu resolvi mudar
esta imagem. E coloquei os três de mãos dadas da seguinte forma:
professora aluna
aluna (imagem
ideal proposta pelo grupo)
aluna
professora aluna (imagem
após a minha modificação)
Colocando-as
nesta segunda posição, busquei descentralizar o poder da professora e dividi-lo
entre os componentes da instituição escolar, responsabilizando a todos.
“A segurança com que a autoridade docente se
move implica uma outra, a que se funda na sua competência profissional. Nenhuma
autoridade docente se exerce ausente desta competência. O professor que não
leve a sério sua formação, que não estude, que não se esforce para estar à
altura de sua tarefa não tem força moral para coordenar as atividades de sua
classe. Isto não significa, porém, que a opção e a prática democrática do
professor ou da professora sejam determinadas por sua competência científica.
Há professores e professoras cientificamente preparados mas autoritários a toda
prova. O que quero dizer é que a incompetência profissional desqualifica a
autoridade do professor.” (FREIRE, 1998. P. 103).
4. No
momento da avaliação final, uma das alunas salientou que o que ela mais gostou
na oficina foi o estímulo ao toque. Para ela, foi importante manter esse
contato com os outros participantes uma vez que no dia a dia não há espaço para
essa interação mais próxima. Ouvi-la falar sobre isto, deixou-me bastante
feliz, pois a minha pesquisa teatral tem como um dos objetivos estimular o
contato entre as pessoas. Acredito também que as pessoas pouco se tocam, se
abraçam e se acarinham.
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